17º dia – Explorando Hiroshima: história, memória e paz
Logo cedo, deixamos o Hotel Brenza, em Kobe, e seguimos rumo à estação de metrô, prontos para iniciar mais um dia pelo Japão. De lá, seguimos até a Shin-Kobe Station, onde embarcamos no Shinkansen Sakura 545 com destino à cidade de Hiroshima e como em outros deslocamentos, utilizamos o nosso JR Pass. Assim, a bordo do trem-bala, aproveitamos o trajeto com tranquilidade, durando cerca de 1 hora e 20 minutos.


Assim que chegamos à Hiroshima Station, não perdemos tempo. Caminhamos diretamente até o Sotetsu Fresa Inn Hiroshima, nosso hotel na cidade, que fica a uma curta distância da estação. Como ainda era cedo para o check-in, deixamos as malas na recepção e começamos a explorar Hiroshima.
Dessa forma, saímos direto para as ruas de Hiroshima, decididos a explorar a cidade a pé. A escolha por caminhar foi excelente, já que muitos dos principais pontos turísticos estão relativamente próximos uns dos outros.
Começamos nosso percurso visitando, em primeiro lugar, o Shukkeien Garden, um jardim tradicional japonês que, logo de início, impressiona pela beleza dos seus caminhos, pontes e lagos. Em seguida, continuamos até o Castelo de Hiroshima que, após sua destruição na Segunda Guerra Mundial, foi posteriormente reconstruído.
Depois disso, seguimos em direção ao local mais emblemático de Hiroshima: o Peace Memorial Park. Caminhar por esse espaço, por sua vez, foi uma experiência profundamente tocante. Finalmente, exploramos também a região de Downtown Hiroshima, onde encontramos ruas movimentadas, comércio vibrante e, além disso, vários cafés e restaurantes.
Hiroshima
Hiroshima é a capital da província de mesmo nome e conta com uma população estimada em 1.200.000 habitantes. A cidade nasceu oficialmente em 1589, quando o poderoso guerreiro Mōri Terumoto decidiu deixar o Castelo Koriyama, na antiga província de Aki, e fundar uma nova capital à beira do Mar Interior de Seto. Poucos anos depois, em 1593, Terumoto já se estabelecia no recém-construído Castelo de Hiroshima, símbolo do poder local.
Contudo, a sorte de Terumoto mudou após a batalha de Sekigahara. Como lutou ao lado perdedor, perdeu seus domínios para Tokugawa Ieyasu, que entregou Hiroshima a Fukushima Masanori, um aliado fiel. Mais adiante, em 1619, o Castelo e a administração da região passaram para Asano Nagaakira, que recebeu o título de daimyō e estabeleceu o Domínio de Hiroshima. Sob o governo da família Asano, a cidade viveu um longo período de estabilidade e prosperidade, expandindo-se continuamente até a Restauração Meiji, em 1868. Por mais de dois séculos, os descendentes de Asano governaram a região com relativa paz, consolidando Hiroshima como um importante centro regional.
Do império à modernização: Hiroshima no século XIX
Na década de 1870, o governo japonês instalou na cidade uma das sete escolas de inglês oficiais, marcando o início de um movimento de modernização educacional. Logo depois, na década de 1880, o governador Sadaaki Senda liderou a construção do porto de Ujina, o que permitiu que Hiroshima se tornasse uma cidade portuária estratégica.
O progresso não parou por aí. Assim, em 1894, a Ferrovia Sanyō chegou até Hiroshima, e uma linha adicional conectou a estação principal ao porto — algo fundamental para o transporte de tropas e suprimentos durante a Primeira Guerra Sino-Japonesa. Durante esse conflito, o governo japonês se transferiu temporariamente para Hiroshima, e o próprio Imperador Mutsuhito utilizou o Castelo de Hiroshima como sede oficial, entre 15 de setembro de 1894 e 27 de abril de 1895.
Enfim, vale mencionar que Hiroshima também sediou, entre 1 e 4 de fevereiro de 1895, a primeira rodada de negociações entre Japão e China para encerrar a guerra. Logo, a cidade passou por um boom industrial, com a criação de fábricas de algodão e outros parques industriais. Durante a Guerra Russo-Japonesa, em 1904, a produção militar local ganhou novo impulso, ampliando ainda mais a importância estratégica da cidade.
A Segunda Guerra Mundial e o ataque nuclear
Durante a Segunda Guerra Mundial, Hiroshima se consolidou como uma cidade militarmente relevante. Sediava o Segundo Exército Japonês e o Comando Regional de Chūgoku, além de contar com grandes depósitos de suprimentos militares e infraestrutura naval. Embora o Japão estivesse sob bombardeios intensos, Hiroshima não foi alvo direto de ataques aéreos — o que aumentava a sensação de que algo maior poderia acontecer.
Assim, às 8h15 da manhã do dia 6 de agosto de 1945, tudo mudou. Um avião B-29 americano, o Enola Gay, lançou a bomba atômica apelidada de “Little Boy” sobre Hiroshima. A explosão matou instantaneamente cerca de 80 mil pessoas. Até o fim daquele ano, os efeitos da radiação e dos ferimentos aumentaram o número de mortos para algo entre 90 mil e 140 mil vítimas.
A destruição foi catastrófica: aproximadamente 69% das construções da cidade foram totalmente destruídas, e mais de 7% sofreram danos severos. Os efeitos do ataque foram mantidos em sigilo durante a Ocupação Americana, e só foram divulgados após a assinatura do Tratado de São Francisco, em 1951, que devolveu a soberania ao Japão.
Como símbolo de esperança, o oleandro foi escolhido como flor oficial de Hiroshima, pois foi a primeira a florescer entre os escombros após a explosão.
Símbolo da paz no Japão e no mundo
Aos poucos, Hiroshima se reergueu. Em 1949, por iniciativa do então prefeito Shinzo Hamai, a cidade foi oficialmente proclamada Cidade da Paz pelo parlamento japonês. A partir daí, Hiroshima passou a receber uma atenção internacional significativa, sediando conferências globais sobre a paz e temas sociais.
Atualmente, o prefeito de Hiroshima ocupa a presidência da organização internacional Prefeitos pela Paz, que reúne cidades do mundo todo comprometidas com a eliminação das armas nucleares.
Em 27 de maio de 2016, o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, tornou-se o primeiro presidente americano em exercício a visitar Hiroshima. Embora sua visita não tenha incluído um pedido de desculpas formal, ele prestou homenagem a todas as vítimas da Segunda Guerra Mundial.

Shukkeien: um Japão em miniatura no coração de Hiroshima
Horário: 09:00 – 17:00 horas.
Nosso passeio por Hiroshima incluiu uma visita encantadora ao Shukkeien Garden, um dos lugares mais tranquilos e fotogênicos da cidade. O nome “Shukkeien” pode ser traduzido como “jardim com cenário encolhido” — uma definição que descreve perfeitamente a proposta desse espaço. À medida que caminhamos por seus caminhos, percebemos como vales, montanhas e florestas surgem em versões miniaturizadas, cuidadosamente moldadas pela arte milenar do paisagismo japonês.
Esse jardim tem uma história que remonta a 1620, criado pouco depois da conclusão do Castelo de Hiroshima. Tudo ali é pensado para representar, em escala reduzida, as paisagens naturais mais impressionantes do Japão.
Assim, o jardim segue os princípios estéticos tradicionais dos jardins japoneses clássicos, com uma atenção minuciosa aos detalhes. Ao redor do lago central, encontramos diversas casas de chá, estrategicamente posicionadas para proporcionar vistas privilegiadas da paisagem circundante.



O Castelo de Hiroshima: símbolo de poder, destruição e reconstrução
Horário: 09:00 – 16:00 horas.
Continuando nosso percurso por Hiroshima, visitamos o imponente Castelo de Hiroshima, também conhecido como Castelo da Carpa. Diferente de muitos castelos japoneses que se encontram no alto de colinas ou montanhas, este é um ótimo exemplo de castelo que se situa em uma planície. Sua torre de menagem principal tem cinco andares de altura e está cercada por um fosso elegante, o que reforça a imponência da estrutura mesmo em terreno plano. Ao redor do castelo, encontramos não apenas a torre principal, mas também um santuário, algumas ruínas e edifícios reconstruídos do Ninomaru, que corresponde ao segundo círculo de defesa do Castelo.
Historicamente, Hiroshima se desenvolveu como uma típica cidade-castelo, tendo o Castelo como seu centro físico, político e econômico. Construído em 1589 pelo poderoso senhor feudal Mōri Terumoto, o Castelo de Hiroshima foi uma importante sede de poder no oeste do Japão, especialmente durante o período feudal.
Curiosamente, o Castelo sobreviveu à onda de demolições ocorrida durante o Período Meiji, quando destruíram muitos castelos como símbolo de um Japão que deixava o feudalismo para trás. No entanto, como o restante da cidade, ele foi completamente destruído pela bomba atômica em 1945.
Posteriormente, reconstruíram a torre de menagem em concreto armado, mas com um exterior cuidadosamente projetado em estilo tradicional japonês. Hoje, a torre abriga um museu informativo sobre a história de Hiroshima, sobre o próprio castelo e sobre os castelos japoneses em geral. No último andar, existe um mirante panorâmico, de onde é possível apreciar vistas da cidade.



Parque Memorial da Paz: uma caminhada pela memória e pela esperança
Seguindo nosso roteiro por Hiroshima, chegamos a um dos lugares mais emocionantes e impactantes de toda a viagem: o Parque Memorial da Paz de Hiroshima. Mais do que um ponto turístico, este é um espaço de reflexão profunda e homenagem às vítimas da bomba atômica lançada sobre a cidade em 6 de agosto de 1945.
O Parque é um grande espaço verde com mais de 120.000 metros quadrados, repleto de árvores, gramados e trilhas para caminhada. Antes da explosão, essa área era justamente o coração político e comercial de Hiroshima, o que explica por que foi escolhida como alvo pelo piloto americano. Quatro anos após o ataque, o governo local decidiu que o local não seria reconstruído, mas sim dedicado à paz e à memória.


O Museu Memorial da Paz de Hiroshima
Horário: 08:30 – 17:30 horas.
No centro do parque, encontramos a principal instalação do complexo: o Museu Memorial da Paz. Dividido em dois edifícios, o museu apresenta uma narrativa completa sobre a história da cidade, os eventos que levaram ao uso da bomba nuclear e, sobretudo, os impactos humanos e sociais da tragédia.
Desse modo, o foco do Museu está nos acontecimentos do dia 6 de agosto, retratando com detalhes comoventes e, muitas vezes, dolorosos, os efeitos imediatos e posteriores da explosão. De fato, os relatos pessoais, objetos danificados, roupas de crianças e registros fotográficos tornam a experiência extremamente tocante. A cada passo, somos lembrados de que a paz não deve ser considerada garantida — e que preservar a memória é um passo fundamental para evitar que algo semelhante se repita.
A Cúpula da Bomba Atômica: símbolo e cicatriz
Logo adiante, nos deparamos com a Cúpula da Bomba Atômica, talvez o símbolo mais icônico de Hiroshima. Também conhecida como Memorial da Paz de Hiroshima, essa estrutura é o que restou do Salão de Promoção Industrial da Prefeitura, um edifício usado antes da guerra para promover o desenvolvimento das indústrias locais.
Incrivelmente, quando a bomba explodiu praticamente sobre o edifício, ele foi um dos poucos que permaneceram de pé. E assim continua até hoje, em ruínas, como um marco tangível do impacto da destruição nuclear. Em 1996, a UNESCO declarou a cúpula Patrimônio Mundial, reconhecendo sua importância histórica e simbólica.


O Cenotáfio das Vítimas da Bomba Atômica
Entre o Museu e a cúpula, encontramos outro ponto de grande carga simbólica: o Cenotáfio das Vítimas da Bomba Atômica. Trata-se de uma tumba em arco, onde estão registrados os nomes de mais de 220.000 pessoas que perderam a vida por causa da bomba — seja na explosão inicial, seja pela radiação que se espalhou nos dias e meses seguintes.
Abaixo do arco, um baú de pedra guarda os registros desses nomes. E todos os anos, no aniversário do ataque, o parque recebe a Cerimônia Memorial da Paz. Um evento com discursos, coroas de flores e um minuto de silêncio às 8h15, exatamente no horário da detonação. Além disso, outras atividades ocorrem ao longo do dia, e vários voluntários e funcionários bilíngues são mobilizados para auxiliar os visitantes estrangeiros.

Downtown Hiroshima: comércio, movimento e sabores locais
Depois de visitarmos o Parque Memorial da Paz e seus arredores, seguimos caminhando em direção ao centro de Hiroshima, também conhecido como Downtown Hiroshima. A cidade tem um centro movimentado e moderno, cheio de vida, comércio e opções gastronômicas que contrastam com a atmosfera solene dos locais históricos.
Assim, o destaque principal do centro é a Rua Hondori, uma galeria coberta exclusiva para pedestres, repleta de lojas, cafés, confeitarias e restaurantes para todos os gostos e bolsos. Essa rua começa bem próxima ao Parque da Paz e se estende para o leste por cerca de meio quilômetro, sendo um dos pontos mais dinâmicos da cidade. Ademais, em paralelo à Hondori, corre a Rua Aioidori (ou Rua Aioi), onde circulam carros e trams (os bondes elétricos típicos da cidade). Ao longo dela, encontramos também algumas grandes lojas de departamentos.


Além do comércio, o Downtown de Hiroshima tem uma cena gastronômica vibrante. De fato, foi ali mesmo que escolhemos um restaurante local para fazer nossa pausa para o almoço. Pedimos um teishoku — uma refeição japonesa completa. O prato principal era uma carne grelhada sobre chapa quente coberta com um molho levemente adocicado e caramelizado. Ademais, acompanhavam a refeição uma tigela de arroz branco japonês (gohan), uma saborosa sopa de missô (missoshiru), picles japoneses (tsukemono), uma pequena porção de karashi, a mostarda japonesa de sabor forte.

Após o almoço, ainda com tempo e disposição, decidimos dar mais uma volta por Hiroshima, aproveitando os últimos momentos de luz do dia. Enquanto caminhávamos, fomos percorrendo algumas ruas menos turísticas, observando o cotidiano dos moradores. Aos poucos, nos dirigimos de volta para o nosso hotel, o Sotetsu Fresa Inn Hiroshima. Assim que chegamos, aproveitamos para descansar, já pensando no dia seguinte, que seria nosso último dia de visitas no Japão.
Nosso roteiro no Japão
Descubra mais sobre nossa viagem pelo Japão clicando nos links abaixo:
- Japão I – Tóquio: Shinjuku e Shibuya
- Japão II – Tóquio: Chiyoda, Ueno, Akihabara e Roppongi
- Japão III – Tóquio: Sumida, Asakusa e Odaiba
- Japão IV – Tóquio: Shiba, Chuo e Ginza
- Japão V – Monte Fuji
- Japão VI – Takayama: Old Town
- Japão VII – Takayama: Higashiyama Walking Course e Hida Folk Village
- Japão VIII – Kanazawa: Kenrokuen Garden e Kanazawa Castle
- Japão IX – Kanazawa: Nagamachi Samurai District, Nishi Chaya District e Higashi Chaya District
- Japão X – Kyoto: Palácios Imperiais, Castelo Nijo, Pavilhão Dourado, Templo Toji e Torre de Kyoto
- Japão XI – Kyoto: Fushimi Inari, Higashiyama e Gion
- Japão XII – Kyoto: Arashiyama e Estação de Kyoto
- Japão XIII – Nara
- Japão XIV – Osaka: Shinsekai, Tenma e Nakazakicho
- Japão XV – Osaka: Osakajo, Minami, Tennoji, Abeno e Nakanoshima
- Japão XVI – Kobe
- Japão XVIII – Miyajima